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Breves reflexões sobre “Brincar com a Narrativa” – a escrita expressiva e lúdica no desenvolvimento da competência compositiva e no estímulo da imaginação e da criatividade: Contributos do Projeto Curricular Integrado 

Bruna Flávia da Silva Cunha  Carlos Manuel Ribeiro da Silva

Universidade do Minho - Instituto de Educação

RESUMO

O presente trabalho surge face a uma observação da qual atentou-se na escassez de atividades de produção textual, ao nível da narrativa, numa turma do 3.º ano do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Foi percetível a dificuldade das crianças ao nível da competência compositiva, na medida em que apresentavam dificuldades de coesão linguística e coerência lógica, concebendo uma narrativa algo incoerente e sem uma estruturação aparente, a qual se distanciava da identificação dos três momentos da ação: introdução, desenvolvimento e conclusão. Os vários textos apresentavam ainda uma porção apreciável de erros ortográficos e um bloqueio da competência criativa e imaginativa.

No decorrer do projeto tentámos perspetivar diferentes atividades e estratégias de ensino e aprendizagem que promovessem uma diversificação de convívio lúdico das crianças com a escrita, conduzindo o desenvolvimento da competência compositiva associada à estimulação da criatividade e da imaginação perante uma escrita criativa, a qual integrou diferentes mediadores de forma a ser instigada.

Face às evidências e resultados obtidos é possível afirmar que o projeto investigativo contribuiu para a construção de uma atitude positiva das crianças perante a escrita, refletindo-se na coadjuvação do desenvolvimento da competência compositiva com a evolução do pensamento criativo e imaginativo. 

Palavras-chave: escrita expressiva e lúdica, competência compositiva, criatividade, imaginação, projeto curricular integrado

ABSTRACT

This work arises from an observation in which we realized the lack of textual production activities in terms of narrative in a class of the 3rd year of the primary school. The difficulty of children regarding their writing skills was more evident when they were asked to write a composition. These compositions were presented with a great amount of grammatical and spelling mistakes, giving these texts a poor and inconsistent narrative without any structural appearance and distancing itself from the three moments of action: introduction, development and conclusion. These compositions even demonstrated a lack in the students’ creative and imaginative ability.

During this project, we tried to create different activities and learning strategies that promoted a diversified and playful connection between the children and their writing. Thereby, the development of their compositional ability along with creative and imaginative stimulation when regarding a creative type of writing was carried on with the integration of different mediators.

Globally, we believe that this research project contributed to a better and positive attitude of those children regarding writing activities, which can be reflected through their growth both in terms of their compositional ability and in terms development of their creative and imaginative minds.

Keywords: playful and expressive writing, compositional ability, creativity, imagination, integrated curricular project

1. INTRODUÇÃO

A investigação relatada nasce no âmbito da unidade curricular de “Prática de Ensino Supervisionada II (PES II), parte integrante do Mestrado em Educação PréEscolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico (1CEB), do Instituto de Educação da

Universidade do Minho, construído através do contributo do Projeto Curricular Integrado (PCI)[1]

Em contexto de estágio, estivemos inseridas num Centro Escolar do centro de Braga, numa turma de 3.º ano. A instituição é constituída pelas valências de Jardim de Infância e 1CEB. A turma é constituída por 20 crianças, com idades compreendidas entre os 7 e os 10 anos.

Apresenta-se, com este texto, de forma sintética, o trabalho desenvolvido ao longo de quatro meses, sustentado num relato das observações e vivências experienciadas. A prática pedagógica orientou-se por princípios que sustentam a prática profissional, nomeadamente o Perfil Geral e Específico do Desempenho Profissional do Educador de Infância e do Professor do 1CEB (Decreto-Lei n.º 240/2001; Decreto-Lei n.º 241/2001).

Desta forma, orientámo-nos por fundamentos e metodologias que apontam a aprendizagem como participativa, comunicativa e integradora, exibindo um cariz sócio construtivista, através do qual nos foi possível desenvolver oportunidades ricas para as crianças para que estas se desenvolvessem intelectual, emocional e socialmente.

Assim, partindo do princípio que o construtivismo não é um processo de ensino, mas sim uma teoria de aprendizagem, procurámos na ação educativa estimular a aprendizagem pela descoberta, criar condições necessárias e oportunas para o sucesso das aprendizagens, com base numa atitude de respeito e valorização, ou seja, considerando a criança como um ser ativo no processo e na construção das aprendizagens, pois esta assume-se como sujeito e não como objeto do contexto educativo (Vigotski, 1896/1934). Deste modo, a ideia de um professor como detentor de todo o conhecimento e a criança como um ser incapaz e ignorante esvanece-se e sobrepõe-se a ideia da criança capaz, autónoma e que adquire voz sobre as suas ideias, pois “de facto, a autonomia, a reciprocidade mútua das relações sociais e a responsabilidade são aqui objetivos” (Fosnot, 1996, p. 10).

Deste modo, as experiências desenvolvidas com o grupo de 3.º ano, apoiaramse nos princípios pedagógicos da “Organização Curricular e Programas” (ME/DEB, 2004), no “Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico” (MEC, 2015) e no “Programa e Metas Curriculares Matemática. Ensino Básico” (MEC, 2013).

2. CONTEXTO EDUCATIVO DE INTERVENÇÃO

A instituição onde decorreu a investigação situa-se em Braga, no Centro Escolar do Fujacal, o qual foi fundado em Setembro de 1992, sendo uma instituição com um estatuto social público, constituída pelo Jardim de Infância e Escola Básica do 1CEB. Trata-se de um estabelecimento de ensino inserido na rede pública, que pertence ao Agrupamento de Escolas EB2/3 André Soares.

O contexto da investigação é uma turma de 3.º ano do 1CEB, constituído por 15 raparigas e 7 rapazes, entre os 7 e os 10 anos de idade. Uma aluna apresenta Necessidades Educativas Especiais (NEE), pelo que se encontra inserida e acompanhada pela equipa de Educação Especial, tendo também a ajuda de um professor de apoio, algumas horas por semana.

Ao longo da observação verificámos que este grupo de crianças é muito afetuoso e acolhedor. Em termos de personalidade, a turma demonstrou ser bastante diversificada, no sentido em que existem crianças muito tímidas e introvertidas e outras bastante mais extrovertidas e expressivas.

As famílias das crianças pertencem a um escalão socioeconómico médio-baixo, sendo que existem vários pais em situação de desemprego. Do ponto de vista de ocupação profissional, verifica-se que os pais têm diferentes profissões e, em termos académicos, as suas habilitações oscilam entre o 4.º ano de escolaridade e a licenciatura. Parece, assim, estarmos perante um espectro de banda larga quanto às questões socioeconómicas e culturais, embora haja algum predomínio que acentua uma lógica de uma classe trabalhadora pouco especializada e de formação académica relativamente elementar ou básica.

Esta turma integra alunos de várias proveniências geográficas e etnias, observando-se uma heterogeneidade cultural: existe uma criança moçambicana, duas brasileiras, duas romenas e duas de etnia cigana. No que se refere ao ritmo de trabalho a turma apresenta ritmos diferentes, mas todos os alunos terminam as suas tarefas em tempo útil e de forma relativamente satisfatória ou bemsucedida.

Ao nível das condutas sociais e interpessoais é notável o bom comportamento desta turma, pelo que, quando a professora titular pratica uma postura de trabalho, de exploração de conteúdos, de mediação e concretização de atividades, os alunos adotam posturas apropriadas de concentração, de auscultação e de interação com as solicitações da própria professora.

As mesas utilizadas pelas crianças encontram-se dispostas em filas, pois, segundo Arends (1995), esta organização permite ao professor focar a atenção em todos os alunos, tanto no trabalho em grande grupo como em pequeno grupo, tendo desta forma, uma intencionalidade pedagógica por parte do docente. É possível verificar-se que o espaço de aprendizagem é decorado com base num propósito pedagógico, aliando-se o trabalho das crianças com o do docente.

Sendo que a exposição de trabalhos na sala de aula é importante, pois possibilita às crianças mostrar o trabalho que têm vindo a realizar, assim como permite que as crianças revejam algumas das aprendizagens realizadas, através de esquemas síntese, a sala detém uma parede revestida por um material que possibilita a afixação de material pedagógico ou trabalhos realizados pelos alunos.

Em suma, o ambiente físico de aprendizagem é “um lugar para o grupo, mas também para cada um, um lugar para brincar e trabalhar (…) um lugar que acolhe diferentes ritmos, identidades e culturas (…) um espaço sereno, amigável, transparente” (Oliveira-Formosinho & Andrade, 2011, p. 12).

3. DEFINIÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DA QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO

O 1CEB deve privilegiar um desenvolvimento integrado de atividades e áreas de saber, assim como de aprendizagens primordiais e significativas para o crescimento social e pessoal das crianças. Assim, o contexto escolar possui um papel essencial no desenvolvimento integral das crianças, assumindo um papel de extrema importância na formação e desenvolvimento de cidadãos críticos, criativos, ativos e responsáveis na sociedade (ME/DEB, 2004).

Deste modo, procedeu-se a uma análise crítica e reflexiva sobre as dificuldades encontradas, tendo como base uma observação, primeiramente direta e mais tarde participativa, que nos possibilitou determinar algumas situações que careciam de reflexão e de uma eventual mudança. Assim, para ultrapassar as dificuldades foi fundamental a integração de uma ação pedagógica capaz de desenvolver uma metodologia de trabalho que fosse pertinente ao contexto da instituição observada.

Com o decorrer de três semanas de observação foi possível presenciar alguns momentos que se podem considerar críticos relacionados com dificuldades de expressão escrita por parte das crianças e de a canalizar pela via da imaginação e da criatividade, no sentido de otimizar a comunicação e a expressividade.

As crianças desta turma estão numa fase de desenvolvimento pleno e intenso da sua competência de escrita, tanto ao nível de escrita de palavras como de textos. Assim, durante uma atividade de levantamento de conceções prévias, na qual era solicitada a criação de um texto narrativo, sendo fornecidas algumas palavras-chave de forma a ajudar as crianças a formar mentalmente um tema, constatou-se a dificuldade das crianças ao nível da competência compositiva. Assim sendo, desenvolveram um texto narrativo que apresentava um domínio deficitário dos mecanismos de organização da informação num texto (relações de dependência e de sequencialidade lógica) e de problemas inter-frásicos, ao nível de concordâncias e de utilização de preposições, ou seja, as crianças não demostravam conseguir “combinar expressões linguísticas para formar um texto” (Barbeiro & Pereira, 2007). Construíram, assim, uma narrativa que não apresentava uma ideia sequencial e coerente, não exibindo um sentido perfeitamente compreensível e estruturado. Pode-se dizer que não se observou, no trabalho de elaboração dos textos, uma estruturação organizada, devidamente sistematizada e interiorizada, onde se percebesse lógicas simples como o alinhamento de uma introdução, o desenvolvimento e o epílogo ou conclusão, revelando-se um texto bloqueado de competências criativas e imaginativas. Os vários textos apresentavam ainda uma quantidade apreciável de erros ortográficos.

Nesta ótica, insurge-se o projeto de investigação intitulado de “Brincar com a narrativa – a escrita expressiva e lúdica no desenvolvimento da competência compositiva e no estímulo da imaginação e da criatividade: Contributos do Projeto Curricular Integrado”, o qual pretendeu, através de uma Escrita Expressiva e Lúdica (EEL), colmatar alguns dos problemas, referidos atrás, e melhorar de forma significativa e substantiva as competências ao nível de uma escrita criativa ao serviço de uma variedade de situações concretas de comunicação e expressão. Assim, a concretização deste projeto de investigação pretendeu desenvolver aprendizagens ao nível dos dois pilares subjacentes ao processo escrito: “escrever para aprender (a escrever e a construir e expressar conhecimentos) (…) e a escrita em termos pessoais e criativos” (Cardoso & Pereira, 2013, p. 12). Com base neste elencar pedagógico, foi viabilizado, segundo Oliveira (2011), o desenvolvimento de uma subcompetência do saber escrever, aliada à criatividade escrita.

Decidiu-se ainda desenvolver este projeto, uma vez que durante as três semanas de observação não se teve a oportunidade de verificar nenhuma prática de textualização, o que se considera um tipo de atividade estrutural para a sistematização e diversificação da linguagem escrita (Santana, 2007).

Mediante estes pressupostos, o projeto “Brincar com a narrativa” assumiu o interesse da intervenção no processo escrito, como um elemento fundamental no desenvolvimento da criatividade e da imaginação, com base numa experimentação sensorial. Deste modo, pretendeu-se promover aprendizagens alusivas a este processo de construção de textos narrativos e de melhoria das competências na linguagem escrita. Pretendeu-se, também, de forma interrelacionada, contribuir para a diminuição da incidência de erros ortográficos, de uma forma lúdica, abrindo portas para o desenvolvimento da criatividade, pois, segundo Pereira (2008), a textualização, ou seja, a redação de um texto, é o aspeto mais complexo no processo de escrita.

Assim, ao longo do projeto de intervenção, relativamente à produção textual criativa, tencionou-se trabalhar “os diversos modos de ação que podem ser adotados pelo professor” e diversificar as “práticas integradoras que devem estar presentes logo no 1.º Ciclo do Ensino Básico” (Barbeiro & Pereira, 2007, p. 5). Nesta lógica, quisemos “transformar o próprio processo de escrita, por forma a colocar ao alcance do aluno todas as potencialidades da escrita” (Barbeiro & Pereira, 2007, p. 17), perspetivando-lhes as diferentes componentes da produção textual, como a planificação, a textualização e a revisão.

Entende-se por atividades lúdicas, a utilização de diversos materiais didáticos tais como álbuns narrativos, livros infanto-juvenis, dedoches, avental das histórias, cartas de histórias para criar e imaginar e aparelhos de som. Em súmula, atentamos a pertinência de se promover um conjunto de atividades que fossem ao encontro das necessidades e dos interesses das crianças que, pela sua índole lúdica e criativa, possibilitassem a envolvência das crianças na EEL, assente no modo narrativo.

4. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

Mediante a contextualização da intervenção e da sua definição e justificação, sentimos necessidade, no processo de investigação e intervenção, de clarificar um conjunto diversificado de conceitos e perspetivas teóricas que serviram de base à construção e desenvolvimento das intervenções didático-pedagógicas, que, por sua vez, sustentaram o processo investigativo. Dada a dificuldade de os tratar aqui de forma detalhada, parece-nos importante nomeá-los de forma sintética: no âmbito da educação básica, foram tratados conceitos de currículo e desenvolvimento curricular, currículo do 1CEB e o constructo de PCI; quanto ao processo de escrita, desenvolveu-se o conceito e a importância da escrita, tratouse de refletir sobre o processo da escrita no contexto de intervenção pedagógica, trabalhou-se a narrativa e as componentes da produção textual, assim como procurou-se indagar sobre os processos de estimulação pelo gosto da escrita e sobre o papel do professor nos mesmos; foi ainda alvo de atenção a questão da escrita criativa – a escrita expressiva e lúdica (EEL) – no despertar da criatividade e imaginação, o que levou à indagação dos conceitos de imaginação, criatividade e escrita criativa, discutindo-se ainda a criatividade no processo de ensino e aprendizagem e o papel professor perante a escrita criativa.

A aclaração da definição do currículo assume-se como essencial nos processos de renovação e inovação escolar, uma vez que, segundo Alonso (1991), este serve de referente integrador de dimensões essenciais na qualidade educativa. Daqui se depreende a necessidade de uma revisão de cariz teórico que atenta sobre ideias essenciais a uma clara perceção do conceito do currículo, assim como sobre a sua organização no contexto da Educação Pré-Escolar e do 1CEB.

É também importante o esclarecimento sobre a metodologia de PCI, como singularizadora de um constructo curricular que tem subjacente a organização integrada dos saberes e das aprendizagens, a qual norteou o trabalho desenvolvido no contexto de intervenção.

No âmbito do projeto de intervenção e investigação, torna-se também fundamental uma revisão reflexiva da literatura que subjaz à problemática em torno da dimensão textual, perspetivada em dois sentidos: um geral, sobre o qual se elabora um quadro teórico em torno da escrita; e outro mais praxeológico, ou seja, centrado na escrita criativa, mais concretamente na EEL.

Segundo Martins (2002), a imaginação é o processo de reconstrução da realidade, sobre o qual podemos associar outros conceitos como a fantasia, o sonho, a invenção, a magia e a criatividade. Cachada (2005) vai ao encontro desta definição e defende que a imaginação abraça a criatividade, no sentido em que para haver criatividade, a imaginação tem de estar presente. Na verdade, a imaginação é “a ação ou o poder de formar imagens mentais de realidades que não estão efetivamente presentes” (Egan, 1994, p. 19), ou seja, a criança retira da realidade imagens que através de um processo de modificação, dissociação e mais tarde de associação, origina uma imagem mental (Menéres, 1993).

Com base nesta ótica, é facilmente percetível a erroneidade da conceção separatista da realidade e da imaginação, pois quanto mais rica for a experiência imagética da criança maior será a quantidade material que a mesma terá à sua disposição para imaginar. Perante este ideal, Cachada (2005) assegura que através de acontecimentos e experiências diversificadas as crianças assumem uma vasta cultura de imagens, as quais permitem florescer o imaginário, sendo estas imagens criadoras, os pré-requisitos para se pensar, agir e escrever criativamente.

5. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO

Elenca-se aqui questões de base metodológica que sustentaram a construção e desenvolvimento do processo de investigação, que se enquadram na intervenção pedagógica desenvolvida na PES II. Considera-se, assim, a investigação-ação como abordagem metodológica a privilegiar neste estudo; identifica-se e esclarece-se a utilização dos instrumentos de recolha de dados deste processo de investigação; apresenta-se o desenho global do projeto e, por fim, identifica-se os objetivos e a estratégias de intervenção pedagógica (com repercussões na aprendizagem escolar e no desenvolvimento profissional docente).

5.1. A INVESTIGAÇÃO-AÇÃO

5.1.1. ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

Do ponto de vista metodológico, a estrutura e o desenvolvimento deste projeto é orientado pela metodologia de investigação-ação (Cohen & Manion, 1989), permitindo a realização de um processo, simultaneamente reflexivo e analítico. A investigação-ação, segundo James McKernam (1998, citado por

Máximo-Esteves, 2008), assume-se como

um processo reflexivo que carateriza uma investigação numa determinada área problemática cuja prática se deseja aperfeiçoar ou aumentar a sua compreensão pessoal. Esta investigação é conduzida pelo prático - primeiro, para definir claramente o problema; segundo, para especificar um plano de ação -, incluindo a testagem de hipóteses pela aplicação da ação ao problema. A avaliação é efetuada para verificar e demostrar a eficácia da ação realizada. Finalmente, os participantes refletem, esclarecem novos acontecimentos e comunicam esses resultados à comunidade de investigadores – ação. Investigação-ação é uma investigação científica sistemática e auto-reflexiva levado a cabo por práticos, para melhorar a prática. (p. 20)

Esta metodologia permite desafiar e desenvolver competências profissionais do professor-investigador, permitindo-lhe compreender e aperfeiçoar o seu local de trabalho (Máximo-Esteves, 2008), assim como tomar consciência da necessidade de diversificar as diferentes formas de mediar o conhecimento. 

Day (2001) refere que a metodologia de investigação-ação carateriza-se por ser “coletiva, colaborativa, auto-reflexiva e crítica” (p. 64), no sentido em que todos os intervenientes são envolvidos durante a sistematização do processo. A investigação-ação, sendo uma metodologia colaborativa, desenvolve-se num ciclo em espiral: observação – reflexão – planificação – ação, relacionando-se a teoria com a prática, de forma a atingir-se uma mudança pedagógica (Dick, 1999, citado por Coutinho, 2006), estando estas duas dimensões, segundo Latorre (2003), sempre interligadas e permanentemente em diálogo.

Assim, tendo em conta o ciclo em espiral, esta metodologia desenvolve-se de uma forma contínua, articulada e dinâmica, pelo que as atividades “têm em comum a identificação de estratégias de ação planeada, as quais são implementadas e depois sistematicamente submetidas à observação, à reflexão e à mudança” (Grundy & Kemmis, 1988, citado por Máximo-Esteves, 2008, p. 21).

Na medida em que a metodologia de investigação-ação sustentou este projeto de natureza investigativa e reflexiva, importa aludir aos instrumentos de recolha de dados utilizados no decorrer do projeto, pois, de acordo com Coutinho et al. (2009), em “qualquer ato de investigação, é sempre necessário pensar nas formas de recolher a informação que a própria investigação vai proporcionando” (p. 373).

Nesta linha de pensamento, Oliveira-Formosinho e Formosinho (2011) asseveram que “a documentação pedagógica é o processo para registar a aprendizagem – a aprendizagem das crianças mas também a aprendizagem dos profissionais” (p. 35), pelo que o professor deve definir os instrumentos de recolha de dados que vão ao encontro do estudo em questão e à sua prática, construindo, assim, uma documentação pedagógica.

Máximo-Esteves (2008) recomenda aos professores-investigadores a “utilizar poucos instrumentos de observação, incidindo naqueles que forem também um bom recurso de aprendizagem dentro da sala de aula e dos quais tenha melhor domínio” (p. 86). Deste modo, os instrumentos utilizados na investigação foram: a observação, as notas de campo, o diário reflexivo, a entrevista, o registo e produções das crianças, fotografias e vídeo, gravações em áudio.

5.2. QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO E OBJETIVOS DO ESTUDO

Mediante a observação, desenvolveu-se um processo contínuo e reflexivo que permitiu perceber a relativa escassez de atividades de produção textual, ao nível da narrativa, as quais se consideram essenciais e estruturais para a sistematização e diversificação da linguagem escrita (Santana, 2007), pelo que surgiu o interesse de dar sentido à questão central do processo investigativo: “Qual o contributo da escrita expressiva e lúdica no desenvolvimento da competência compositiva e no estímulo da criatividade e da imaginação?”.

Mediante o problema de investigação, pretendeu-se construir, segundo a metodologia do PCI, uma diversificação de práticas educativas que proporcionassem às crianças aprendizagens significativas e construtivas, importando relevantes contributos do quadro teórico sócio construtivista e envolto num ambiente de aprendizagem ativo e lúdico. Pretendeu-se ainda envolver as crianças ao longo de todo o processo de ensino e aprendizagem, perspetivando um desenvolvimento ao nível da sua autonomia e responsabilidade (Alonso, 1996, 2001, 2004; Castro & Ricardo, 1994; Roldão, 1999), assim como uma reflexão pessoal e profissional, de forma a refletir sobre as práticas com o intento de as ver melhoradas.

Propôs-se, assim, alguns objetivos para sustentarem a realização deste projeto de investigação, estruturados em dois âmbitos: um em torno de questões pedagógicas e que se referem às aprendizagens escolares a desenvolver pelas crianças; outro em torno de questões de estruturação do conhecimento profissional, que remetem para aprendizagens do foro profissional, também identificado como fazendo parte dos processos de desenvolvimento profissional docente e da construção do conhecimento profissional.

Quanto às aprendizagens das crianças, pretendíamos: promover a aprendizagem da competência compositiva, no domínio do texto narrativo; proporcionar múltiplas situações que possibilitassem às crianças de imaginar, como fonte de construção da EEL; promover a apropriação de competências linguístico-criativas; explorar as diferentes componentes da produção textual – planificação, textualização e revisão; fomentar o gosto pela EEL; propiciar experiências de aprendizagem que garantam o prazer da escrita, com base em estímulos lúdicos.

No que diz respeito à aprendizagem e desenvolvimento profissional docente, queríamos: avaliar e analisar a emergência do (re)conhecimento e identidade profissional; averiguar e avaliar o impacto da intervenção pedagógica no desenvolvimento das competências de escrita e leitura de textos como processos de construção do conhecimento das crianças; analisar o papel do professor como mediador do desenvolvimento e da aprendizagem das crianças; averiguar das potencialidades do desenvolvimento curricular através de uma proposta de construção de um PCI, assumindo o professor um papel de mediador e construtor do currículo.

5.3. PLANO DE INTERVENÇÃO – O PROJETO CURRICULAR INTEGRADO

Um plano de intervenção apresenta-se como um instrumento flexível e articulado que sintetiza o labor do projeto realizado, pelo que deve ter por base a “observação dos alunos, a avaliação das suas práticas e a decisão sobre as que deve considerar ou mudar” (Fisher, 2001, citado por Máximo-Esteves, 2008, p. 82). Pretendíamos, assim, que o projeto obedecesse a um elencar de passos, conjurados numa lógica sequencial e temporal, possibilitando uma integração flexível entre os mesmos com o intento de desenvolver um plano de intervenção, sobre o qual poderíamos orientar a prática educativa.

Torna-se, assim, relevante voltar a aludir à importância da observação como o estímulo inicial para o surgimento do projeto de intervenção. Seguiu-se a planificação, de forma a perspetivar uma intervenção frutífera que fosse ajustada à turma e ao contexto educativo. Nesta ótica, as planificações construídas ao longo do projeto de intervenção, visavam objetivos viáveis que fossem ao encontro das orientações prescritas nos documentos oficiais e integravam estratégias de avaliação que fossem adequadas aos diferentes objetivos propostos. Conforme refere Zabalza (1992, pp. 47-48),

planificar é tratar-se de prever possíveis cursos de ação de um fenómeno e plasmar de algum modo as nossas previsões, desejos, aspirações e metas num projeto que seja capaz de representar, dentro do possível, as nossas ideias acerca das razões pelas quais desejaríamos conseguir, e como poderíamos levar a cabo, um plano para as concretizar.

Foram constatadas três evidências, as quais deram suporte ao projeto de intervenção e subsequente projeto de investigação. A primeira evidência observada e que dá apoio ao projeto de investigação é o caráter lúdico, uma vez que esta dimensão não era muito utilizada em contexto e ao mesmo era bastante apreciada pelas crianças, na medida em que estas demostravam entusiamo e interesse em aprender aquando da exploração de atividades subjacentes à ludicidade, ou seja, sem a sistemática utilização do manual escolar.

Foram ainda constatadas duas evidências, sendo que cada uma delas perspetivou dois projetos de investigação, sobre os quais se instituíram e desenvolveram dois planos de intervenção, de forma integrada. Mediante o apresentado, observou-se que as crianças demostravam dificuldades ao nível do raciocínio matemático e da capacidade de cálculo mental e, por outro lado, atentou-se que os alunos apresentavam dificuldades ao nível da competência compositiva, mais concretamente ao nível dos textos narrativos, assim como canalizar a escrita pela via da imaginação e da criatividade.

Figura 1 - Desenho do PCI

Com base no carácter transversal da competência compositiva, assim como da criatividade e da imaginação, foi viável uma articulação entre os dois projetos de investigação, através de um núcleo globalizador perspetivado pelo lúdico e concretizado por uma intervenção pedagógica integradora e reflexiva que foi sustentada pela metodologia do PCI.

Decidimos trabalhar a metodologia do PCI, no sentido em que este possibilitou o realizar de atividades integradoras, as quais se constituíram como “espaços/ tempos pedagógicos privilegiados para organizar o conhecimento escolar de forma globalizadora e contextualizada na experiência da criança, desencadeando processos de investigação educativa que requerem dos alunos uma postura de pesquisa e de reflexão perante a cultura e o saber” (Alonso, 2001, p. 13). Assim, torna-se percetível que o PCI (Figura 01) possibilitou a construção, ao longo do projeto interventivo, de um conhecimento integrado entre os significados que a criança já possuía com os conhecimentos que foi adquirindo, sobre o qual o aluno foi construindo os seus próprios significados (Alonso, 2001).

De seguida apresentamos a Tabela 01, referente à sistematização das tarefas realizadas durante a concretização deste projeto investigativo, no âmbito da competência compositiva e do despertar da criatividade e da imaginação, tendo como referência uma EEL. As atividades estão organizadas em torno das diferentes fases e respetivas questões geradoras, assim como dos objetivos pedagógicos e de investigação. Contudo, apenas as atividades que estão destacadas a negrito foram alvo de descrição e análise de resultados, com o intento de clarificar o trabalho desenvolvido e as aprendizagens envolvidas em cada uma delas.

De forma a clarificar o desenvolvimento do projeto de investigação, procedemos a uma breve explicação estruturada em quatro fases. A Fase 1 foi importante para se analisar atenta e reflexivamente os interesses e as necessidades das crianças, de forma a definir o problema a investigar. Assim, procedemos a uma atividade de levantamento de conceções prévias, relacionadas com a área curricular de Português, na qual entendemos a dificuldade das crianças ao nível da competência compositiva e de canalizar a expressão escrita pela via da criatividade e da imaginação. Com base nesta atividade, foi possível observar e recolher dados que sustentassem o planeamento das atividades posteriores.

Na Fase 2 foram desenvolvidas várias atividades com um fio condutor que dizia respeito ao desenvolvimento da competência compositiva e da estimulação da criatividade e da imaginação, através da EEP. É importante referir que cada atividade sofria posteriormente uma reflexão, ou seja, posteriormente às crianças explorarem a atividade e escreverem a sua composição, eram escolhidas aleatoriamente duas composições sobre as quais as crianças procediam a comentários de forma a desenvolver a competência crítica e, ainda, desenvolverem a “ação sobre o processo de escrita” (Barbeiro & Pereira, 2007, p. 7). 

Numa Fase 3, as crianças estavam ansiosas por mostrar à comunidade educativa uma produção textual, da autoria da turma. Neste sentido pesquisámos, via internet, uma atividade que nos possibilitasse divulgar “As Peripécias do Peter Pan”, encontrando mais tarde o “Kamishibai” que possibilitou uma atividade de animação leitora. Assim, as crianças puderam partilhar com a comunidade educativa, de forma entusiasta, os conhecimentos concretizados ao longo do projeto que ficaram elencados na narrativa criada. Já na Fase 4, num momento de grande grupo e sentados numa manta, as crianças partilharam reflexivamente as aprendizagens que foram realizando, os novos conhecimentos que foram adquirindo, o que mais gostaram e menos gostaram, de forma a perspetivar-se a significatividade do projeto para as crianças, assim como o desenvolvimento do seu metaconhecimento.

Tabela 1 - Todas as fases

6. SÍNTESE DOS RESULTADOS

No decorrer do projeto desenvolveu-se uma intervenção significativa e estimulante, a qual instigou a realização de uma avaliação contínua e metódica com os principais intervenientes, ou seja, as crianças. Esta era realizada no final ou no início de cada atividade e assente numa técnica de dinâmica de grupo, que consiste, na opinião de Not (1991), na substituição da dialética professor-aluno, pela dialética entre o eu e o outro.

Mão-de-Ferro e Fernandes (1990) definem esta técnica como “um conjunto de indivíduos com um objetivo comum e em interdependência para atingir o fim que os reconheceu” (p. 69). As crianças, através de uma discussão mediada, avaliavam a prestação de cada um, atentando sobre a competência compositiva concretizada nas diferentes produções, assim como o grau de criatividade demostrado. Refletia-se ainda, ao longo do projeto, questões como: “O que sabemos?” e “O que temos de melhorar?”, propiciando-se o desenvolvimento do metaconhecimento, ao elencarem as aprendizagens, conhecimentos e estratégias desenvolvidas e conhecidas.

Assim, é possível reiterar a significatividade e a imponência destas ocasiões de reflexão, na medida em que estas possibilitam que o projeto não se desatualize e estagne (Canário, 1992). Portanto, propiciou-se um ambiente gratificador de comunicação e de trabalho que teve como principal intento integrar as crianças nas suas aprendizagens e nas aprendizagens dos outros (Cortesão, Leite & Pacheco, 2002).

Na fase final do projeto, as crianças quiseram concretizar uma última atividade de avaliação qualitativa, desenvolvendo-se, assim, a avaliação final do projeto por parte dos alunos. No decorrer desta introspeção, as crianças elencaram as aprendizagens concretizadas, os novos conhecimentos, as diferentes atividades e estratégias desenvolvidas, possibilitando-nos perceber se os objetivos estabelecidos foram ou não atingidos, pois a “avaliação realizada com as crianças é uma atividade educativa, constituindo também uma base de avaliação para o educador” (ME/DEB, 1997, p. 27). Este momento de avaliação foi realizado oralmente e num ambiente de descontração.

Ainda no que diz respeito à avaliação, consideramos que seria aliciante perguntar às crianças as atividades que mais gostaram de realizar e as que, pelo contrário, menos gostaram de concretizar. Assim, foi possível verificar que a atividade que as crianças mais gostaram foi a de mediação leitora “Apresentação da narrativa «As peripécias do Peter Pan»”. Relativamente às atividades que menos gostaram, as crianças elegeram a que diz respeito ao “Texto narrativo – consolidação”, uma vez que “não foi tão divertida como as outras”.

Toda esta realidade plural permitiu patentear diversas aprendizagens, as quais nos possibilitaram perceber os conhecimentos adquiridos pelas crianças ao participarem neste projeto. Apresenta-se, assim, alguns dos conhecimentos elencados pelos alunos: – Concetuais – quanto ao saber, as crianças elencaram o texto narrativo (os três momentos de ação), a descrição de personagens, a planificação (organização e estruturação), a escrita de falas, assim como novo vocabulário (EEL, criatividade, imaginação, mediadores cinético-dramáticos, álbum narrativo, dedoches, avental de histórias, Kamishibai, planificação, textualização, revisão, …); – Procedimentais – relativo ao saber fazer, foi mencionado a planificação, textualização, revisão, avaliação, seleção, divulgação, reflexão, construção do Kamishibai e de narrativas gráficas e a utilização de todos estes conteúdos concetuais; – Atitudinais – em termos de saber estar e saber ser os alunos aludiram à partilha de conhecimentos, à cooperação (ligada à componente da produção textual-revisão), atenção, empenho, sentido estético e crítico, à criatividade e imaginação, à autonomia.

A par desta avaliação qualitativa, descrita anteriormente, englobou-se também uma perspetiva quantitativa, realizada com recurso a tabelas, com o intento de corroborar os dados qualitativos de uma forma mais minuciosa.

Assim, com base numa coadjuvação entre estas duas avaliações foi possível situar as dificuldades de cada criança, tentando descobrir novas estratégias adequadas que possibilitassem intervir positivamente nessas arduidades, assim como também comparar os resultados atividade por atividade.

Mediante o apresentado, Bach (2001) afirma que “a avaliação precede (…) ou conclui (…) a aprendizagem considerada; ou, ainda, ela pode ser efetuada no decorrer desta mesma aprendizagem, visando melhorar a sua qualidade” (p. 223), pelo que, ao longo deste projeto, para além da avaliação qualitativa, como por exemplo, quando utilizávamos uma grelha de observação, assim como quando nos servíamos de outras estratégias de recolha de dados, utilizávamos uma tabela de análise/avaliação das produções das crianças, que integrava simultaneamente uma avaliação qualitativa e quantitativa, sendo que os dados quantitativos apresentam-se numa lógica suplementar, de forma a corroborar os dados qualitativos, na medida em que o projeto se apresenta como um estudo qualitativo, descritivo e interpretativo.

Portanto, indo ao encontro do perspetivado por Bach (2001), foi realizada uma avaliação anterior à aprendizagem, concretizada na atividade de conceções prévias, sendo esta avaliação o ponto de partida do projeto.

Essa tabela de avaliação desenvolveu-se com base nos critérios de classificação da Prova Final de Português do 1CEB (Instituto de Avaliação Educativa, 2015). Todavia concretizou-se algumas alterações com o intento de a adequar aos objetivos elencados pelo currículo nacional para o 3.º ano, no que diz respeito à escrita criativa de textos literários. Assim, ao utilizar este instrumento de avaliação numa perspetiva qualitativa, a qual caracteriza o projeto investigativo, permitiu-nos entender o desenvolvimento dos alunos relativamente à competência compositiva e à criatividade, através de uma EEL.

No decorrer da correção das diferentes composições, desenvolveu-se uma visão ampla, prudente e justificada das necessidades individuais dos alunos, bem como do impacto das estratégias de ensino e aprendizagem nos mesmos. Com base nestas observações, foi possível harmonizar as aprendizagens às necessidades e interesses das crianças.

Perante o apresentado, é possível reiterar que a avaliação determinou toda a sequência de intervenções (Bach, 2001, p. 226). Contudo, salienta-se que este instrumento de avaliação possibilitou concomitantemente uma avaliação quantitativa, visto que foi possível comparar os resultados demonstrados nas diferentes produções textuais, numa ordem cronológica e sequencial. Destaca-se ainda a dificuldade deste instrumento de avaliação, pois “corrigir, respeitando o estilo, um texto que foi gerado por outro imaginário não é tarefa fácil” (Santos & Serra, 2011, p.184).

Em síntese, perante a observação realizada e os dados obtidos, é possível afirmar que se desenvolveu um progresso evolutivo nas produções textuais das crianças. Pode-se atentar numa melhoria significativa nos diversos parâmetros de avaliação elencados, quando se confronta a primeira produção textual com a segunda, a segunda com a terceira e assim sucessivamente até se chegar à última produção textual avaliada, que diz respeito à atividade de EEL a partir da exploração dos sons da natureza.

De facto, perante os dados apurados permitimo-nos a acrescentar que a ação sobre o processo de escrita, coadjuvado com a ação sobre o contexto, viabilizou o desenvolvimento da competência compositiva. Assim, através de uma reflexão sobre a escrita, as crianças construíam e expressavam conhecimentos (Barbeiro & Pereira, 2007), instigando-se, assim, uma aproximação ao descomplicar da complexidade do processo de escrita.

Em suma, as atividades desenvolvidas possibilitaram aos alunos a participação na construção de aprendizagens significativas e funcionais, que partiram de situações e objetos reais, vivenciadas no decorrer do projeto e que foram transportadas para a concretização das atividades (Cortesão, Leite & Pacheco, 2002). Consequentemente, perante as várias justificações decorrentes da observação e da avaliação maioritariamente qualitativa e ainda quantitativa, é possível reiterar que uma prática de ensino e aprendizagem assente numa integração da dialética entre o eu e o outro “é um caminho apropriado para melhorar a qualidade das aprendizagens, numa perspetiva competencial, ligando o saber ao saber fazer, o pensar ao agir, a autonomia e a participação, a formação pessoal e a social. É isto que dá sentido à escola” (Alonso, 2005, p.13).

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo da investigação, as crianças foram propiciadas com estratégias educativas que lhes possibilitaram, de forma lúdica, desenvolver aprendizagens ao nível da dimensão textual, através de uma EEL.

Esta realidade plural acentua o trabalho prazeroso que as crianças desenvolveram ao nível da competência compositiva, ativada pela produção textual ao longo das diferentes atividades desenvolvidas. Mediante este trabalho, observou-se um crescimento exponencial da competência criativa e imaginativa que é inerente à infância. Contudo, esta necessitava de diferentes estímulos para se desenvolver, os quais foram ativados pelas diversas estratégias lúdicas de ensino e aprendizagem.

Assim, face às evidências e resultados obtidos é possível afirmar que o projeto de intervenção e investigação contribuiu para a construção de uma atitude positiva das crianças perante a escrita, refletindo-se na coadjuvação do desenvolvimento da competência compositiva com a evolução do pensamento criativo e imaginativo. 

Noutro sentido, o espaço de prática educativa apresenta-se como um primeiro contexto de construção de identidade profissional dos futuros educadores/ professores que possibilita um desencadeamento de processos de (re)interpretação das experiências vividas, influenciando diretamente cada profissional (as suas crenças e perceções) (Flores & Simão, 2009). Assim, o espaço de prática pedagógica compõe o primeiro contacto com o saber “profissional específico que se desenvolve na confluência dos saberes teóricos e das competências técnicas e pedagógicas” (Mesquita-Pires, 2007, pp.4-5).

Em conformidade, pode-se afirmar que o candidato a professor aprende muito a fazer e fazendo, na medida em que experiencia um contacto com o trabalho laboral constituinte do mundo real, possibilitando-lhe experimentar e vivenciar uma realidade educativa, por ele desconhecida. Desta forma, desenvolve e aplica conhecimentos, estratégias, metodologias, aptidões e atitudes profissionais e pessoais (Bueno, Carvalho & Tejada Fernández, 2013).

Com a construção do PCI apercebemo-nos da utilidade desta metodologia, nos contextos escolares, na medida em que este exibe um carácter metodológico e criativo, promovendo uma integração curricular, que se corporifica pela envolvência dos alunos em procedimentos como a investigação, a cooperação, a planificação, a reflexão e posterior avaliação, através da estruturação e desenvolvimento de atividades integradoras variadas e enriquecedoras. Deste modo, afirma-se que foi uma mais-valia a integração do PCI neste contexto de intervenção e investigação, pois possibilitou-nos articular as várias áreas curriculares, conceitos, procedimentos, assim como atitudes (Alonso & Roldão,

2005).

Finalizando esta apreciação qualitativa, procurámos olhar este projeto, como um trabalho perspetivado por uma pedagogia de direitos, pois este “resgata as crianças como sujeitos, vendo-as em ação, observando-as, escutando-as, documenta-as” e permite “documentar a sua ação, as suas interpretações, permite incluí-las na projetação do quotidiano pedagógico” (Oliveira-Formosinho & Costa, 2011, p. 13).

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[1] Pode-se consultar o relatório final deste trabalho intitulado “Brincar com a narrativa: a escrita expressiva e lúdica no desenvolvimento da competência compositiva e no estímulo da imaginação e da criatividade: contributos do Projeto Curricular Integrado”, no seguinte URL – http:// hdl.handle.net/1822/43556.