Novas tecnologias e o direito do trabalhador a desligar do trabalho: realidade ou utopia?
Temática da conferência: novos paradigmas da relação de trabalho
DOI:
https://doi.org/10.26537/iirh.vi7.2608Palavras-chave:
Novas tecnologias, Tempo de trabalho, Direito a desligar, Controlo do empregadorResumo
A utilização crescente das novas tecnologias no local de trabalho potencia as situações de controlo dos trabalhadores pelo empregador. Controlo esse exercido para além dos limites máximos do tempo de trabalho. De tal forma que, muitos trabalhadores estão continuamente “ligados” ao trabalho.
Estas práticas abusivas do empregador além de impedirem o trabalhador de usufruir dos períodos de descanso que a lei lhes atribui, provocam danos sociais consideráveis, quer ao nível pessoal e familiar, quer agravando o nível de stress a que o trabalhador está exposto em face da pressão constante em que se encontra.
A ligação permanente do trabalhador ao trabalho, verifica-se, quer nas situações em que o trabalhador presta a sua atividade através do teletrabalho, quer nas outras situações em que o empregador obriga o trabalhador a estar sempre disponível para o trabalho fora do local e do tempo de trabalho.
Esta disponibilidade sucessiva pode consistir em responder aos e-mails do empregador, em atender o telefone (muitas vezes propriedade do empregador), ou em gerir ininterruptamente aplicações instaladas no telefone do trabalhador.
A questão da utilização das novas tecnologias no local de trabalho tem sido prevista na lei, em especial no Código do Trabalho (artigos 14.º e seguintes), na perspetiva de garantir ao trabalhador a reserva da sua vida privada, e de impedir que o empregador as utilize como forma de controlo da atividade do trabalhador.
Recentemente discute-se a questão de saber se o trabalhador tem o direito a desligar do trabalho quando se encontra para lá do seu horário ou tempo de trabalho.
O tema é recente. A discussão está lançada em especial após a entrada em vigor do artigo 55.º da lei do trabalho francesa, que concedeu ao trabalhador o direito a desligar do trabalho, nomeadamente o direito a não consultar e-mails ou de não atender o telemóvel fora do horário do trabalho.
Em Portugal, o tema discute-se sobretudo na comunicação social e juridicamente, não havendo outras normas, terá de ser enquadrado nos artigos 197.º e seguintes do Código do Trabalho que disciplinam a duração e organização do tempo de trabalho.
Ao longo dos tempos, a matéria do tempo de trabalho vem sendo um dos aspetos mais problemáticos da execução do contrato de trabalho, porque espelha a realidade antagónica de empregadores e trabalhadores.
E, não obstante os limites máximos dos tempos de trabalho estarem fixados por normas de caráter imperativo, como já se alcançou, estas normas não se tem mostrado suficientes e adequadas a garantir ao trabalhador o direito a não trabalhar, ou a desligar do trabalho quando não está no seu tempo de trabalho.
As situações de abuso do tempo de trabalho pelo empregador têm sido potenciadas pela crise económica que vivemos, e pela necessidade imperiosa de garantir a subsistência das empresas – afinal os empregadores.
Em face do quadro jurídico vigente, o que podem esperar os trabalhadores portugueses? Poderão os invocar perante os seus empregadores o direito a desligar do trabalho sem arriscar sanções ou outros prejuízos na relação de trabalho?
Poderá este direito vir a tornar-se uma realidade, ou será, face a todo o circunstancialismo económico e jurídico, uma utopia?